Argumento





...a imagem como um vento que se lança livre na direção das coisas...



A imagem como um caminho sobre o qual passam em todos os sentidos as modificações que se propagam na imensidão do universo. No filme ‘A mulher que amou o vento’, encontros com imagens que incorporam atributos desse elemento primordial. Espaços amplos e abertos frente a tentativas de aprisionar o vento: o amor que se pensa livre e ao mesmo tempo deseja a posse; objetos que anunciam ou denunciam a sua passagem: cata-ventos, birutas, pipas, cortinas em janelas abertas, roupas no varal, águas; matérias que podem ser carregadas ou modificar o rumo do vento: penugens, algodão, tecidos, papéis, folhas, flores, madeira, ferro, terra; objetos que o simulam: ventiladores, leques, abanadores; o vento e o corpo: sopro, assobio, respiração, sons, pele e pêlos.

Flora é uma jovem que vive sozinha em uma casa nas montanhas, cercada pelas flores de seus jardins e pelos constantes ventos. Esses ventos não são ventos determinados, que sopram em algum lugar. O que é nessas montanhas espreitado com a mais delicada sensibilidade, não é o que o vento realmente é, mas o modo como aparece quando, sinuoso e descontínuo, sopra de folha em folha, quando deforma o espelho d'água, quando faz uma gota solitária buscar hesitante seu caminho sobre a vidraça, quando a vida se reflete no chão coberto de folhas, papéis e poeiras.

Quando Flora nasceu o vento cantava na janela do quarto e entrou por uma fresta. Ela imediatamente parou de chorar. Daquele instante em diante nada a tocou como o vento. Arriscava-se pelo prazer de soprar as feridas. Em cada momento da vida, teve a companhia de brisas e vendavais. Passa seus dias entre roupas, flores e a inventar jogos com o vento, faz longos passeios pelas montanhas carregando uma biruta para saber em que direção segue seu amado. Armadilhas com linhas, guizos e longos tecidos, Flora só pára quando encontra para soprar uma esperança (dente-de-leão).

Há alguns anos o vento parou de soprar repentinamente e Flora ficou muito aflita. Passava o dia com abanadores, mas seus braços começaram a doer constantemente, até que não agüentando mais, foi a vilarejos em suas redondezas e conseguiu trocar seus vasos de flor por ventiladores. Encheu um quarto com eles e passava os dias a bailar entre os ventiladores ligados, sem sorrir, porém.

Quando o vento voltou anunciando a primavera, Flora correu pelas montanhas até o rio, onde dançou por longas horas, até que o vento enamorado de tamanha beleza e paixão, a raptou carregando Flora para além das margens.